Menu

Pesquisar
Close this search box.

Matéria Especial | Você já ouviu falar em Práticas Integrativas e Complementares em Saúde?

Matéria Especial | Você já ouviu falar em Práticas Integrativas e Complementares em Saúde?

A pandemia de COVID-19 causou muitos impactos na população brasileira, e um deles é o adoecimento mental. Entre os grupos mais afetados estão os docentes, que muitas vezes precisam buscar ajuda nos serviços de saúde. Por isso, o Comitê de Saúde da ADUFSCar, vem refletindo sobre a forma de abordagem das questões de saúde mental nos serviços de saúde. Uma das conclusões é que essa abordagem deve ser integral, levando em conta aspectos biopsicossociais e não se baseando somente no modelo biomédico. Nesse contexto, as Práticas Integrativas e Complementares (PICs) têm ganhado destaque.

“As PICs são tratamentos que utilizam recursos terapêuticos baseados em conhecimentos tradicionais, visando a prevenção de diversas doenças, como depressão e hipertensão. Esses métodos não são medicamentosos e buscam promover o autocuidado, a escuta acolhedora, o vínculo e a integração com o meio ambiente e a comunidade”, esclarece a profa. Paula Serrão, tesoureira da ADUFSCar e coordenadora do Comitê de Saúde do Sindicato.

No Brasil, as PICs são oferecidas no Sistema Único de Saúde (SUS) desde 2006. Atualmente o sistema público disponibiliza 29 terapias, entre elas: medicina tradicional chinesa, homeopatia, acupuntura, plantas medicinais e fitoterapia, meditação, reiki, shantala, yoga e terapia de florais. E mesmo integradas ao SUS, as PICSs não são consenso entre médicos e cientistas que chegam a combatê-las e afirmam faltar evidências científicas de sua eficácia.

Para o médico, mestre e doutor em saúde coletiva e professor do Departamento de Medicina da UFSCar, Gustavo Nunes de Oliveira, a ciência e a classe médica atualmente têm procurado se alçar ao papel de regulador universal da verdade e da vida, individual e coletiva. Esses atores sociais, segundo ele, não criticam apenas as PICS, mas opinam sobre tudo. “A medicina científica atual nasceu há pouco mais de 300 anos. Mas teve seu desenvolvimento alavancado nos últimos 100 anos, em especial no último meio século. O método científico, conforme hoje constituído, tem suas bases modernas no século XVII. A questão não é se a ciência é o caminho da verdade ou não, mas uma questão anterior, ou seja, como a ciência e a medicina científica trata aquilo que sabe o que não sabe. A discussão das evidências das PICS é um exemplo corriqueiro das confusões que se fazem sobre o que a ciência tem capacidade de regular”, explica.

O prof. Gustavo lembra que o Brasil tem um arcabouço de leis e sistema de normas infralegais muito competente para regular práticas de saúde, medicamentos, insumos, vacinas, alimentos, etc. “Qualquer oferta terapêutica, para acontecer no SUS ou em qualquer outro estabelecimento de saúde precisa respeitar essas normas, que representam a preocupação da sociedade, com a proteção da saúde individual e coletiva. As PICS também estão submetidas a essas normas. Desde o chá de camomila, dos extratos padronizados, drogas sintéticas, hemoterapia, tratamento de câncer, etc, estão submetidos à regulação específica. Muitos médicos e pesquisadores interessados em desqualificar técnicas e sistemas terapêuticos incluídos nas PICS, não estão informados dessa regulação existente e as desqualificam de forma generalizante”, argumenta ele.

O médico acrescenta ainda que há serviços de saúde em diversos municípios brasileiros e em todas as regiões do país que ofertam as PICS aos usuários do SUS.  “Em termos relativos, as PICS vêm se tornando mais disponíveis do SUS. Mas esse crescimento é ainda muito pequeno se comparado ao setor privado da saúde. Os seguros de saúde incorporaram diversas das PICS em seus catálogos de serviços credenciados. As PICS são uma realidade hoje e principalmente para as populações de alta e média renda. Os ricos do Brasil se tratam com as PICS”, destaca o prof. Gustavo.

Com atuação no ensino, pesquisa e extensão em temas que envolvem farmacologia, plantas medicinais, fitoterápicos e fotobiomodulação, o professor Gerson J. Rodrigues defende a ampliação da formação de profissionais na área. “A prescrição de fitoterápicos pode ser feita por alguns profissionais da área da saúde, incluindo médicos, farmacêuticos, nutricionistas, dentistas, enfermeiros, e outros, de acordo com as normativas dos seus conselhos de classe”, diz o coordenador do Curso de Especialização em Fitoterapia Clínica do Dpto. de Ciências Fisiológicas da UFSCar. Porém, segundo ele, poucos cursos de graduação oferecem a formação em sua grade curricular e quando isto ocorre, a carga horária é muito pequena e suficiente apenas para os aspectos mais introdutórios. “Há uma deficiência na formação de profissionais da área da saúde com sólido conhecimento sobre as plantas medicinais e fitoterápicos, por exemplo, limitando o uso racional pela população que será atendida por estes profissionais. A inclusão de disciplinas voltadas para formação de prescritores de plantas medicinais e fitoterápicos certamente contribuirá para o consumo seguro e eficaz pela população”, avalia.

O pesquisador ressalta que as plantas medicinais e fitoterápicos que integram a lista das PICs, são plantas com grande evidência científica sobre sua eficácia. “Muitos fitoterápicos já possuem seu uso validado pela pesquisa científica e são comercializados em apresentações tradicionais e como medicamentos magistrais (manipulados) e industrializados. Inclusive, a pesquisa científica em seus diferentes campos, é uma destas exigências, destacando a necessidade de estudos bem controlados com fitoterápicos e plantas medicinais, com produtos padronizados. Atualmente, há no mercado fitoterápicos com elevada qualidade, como os extratos padronizados. Esta padronização deixa o tratamento mais seguro, uma vez que não há variação na concentração dos principais ativos do fitoterápico. O controle desses medicamentos é feito pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Vigilâncias Sanitárias Municipais e Estaduais”, reforça o prof. Gerson.

PICS nos serviços de saúde pública

Em São Carlos, o tema das Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICs) surgiu no âmbito do poder municipal em 2011 com uma Lei que implantou as “Terapias Naturais e Práticas Integrativas”. Em 2014, foi criada a Semana de Fitoterapia e em 2016 a inclusão de medicamentos fitoterápicos na Rede. No ano de 2015, foi realizado o Fórum Municipal de PICs e Educação Popular em Saúde (EPS). A promulgação daa Lei 18.798 que instituiu o Programa Municipal de PICS e EPS ocorreu em 2018, mesmo ano de criação da Comissão Municipal de Práticas Integrativas e Complementares e Educação Popular em Saúde – COMPICS&EPS, ligada à Secretaria Municipal de Saúde.

As docentes da UFSCar e associadas à ADUFSCar, Maria Waldenez de Oliveira e Aline Barreto de Almeida Nordi (DMed), são duas das três representantes do segmento das IES na atual gestão 2022-2023.

“Por estarmos no início da implantação do Programa e da qualificação de trabalhadores e trabalhadoras de saúde para a oferta das PICS, estas têm sido ofertadas como parte do cuidado que as/os profissionais oferecem em Unidades de Saúde ou em Centro/Serviço específico (Centro de Especialidades Odontológicas, Ambulatório Oncológico e Serviços de Urgência)”. comenta profa. Waldenez Oliveira.

Já foram promovidas formações, como em Educação Popular em Saúde que formou 62 servidores e servidoras do SUS em 2017 e 2018 em parceria com a UFSCar. Também já foi ofertado o Curso de Auriculoterapia do Ministério da Saúde, sendo um polo em São Carlos no ano de 2019. Atualmente, três trabalhadoras estão sendo formadas em Acupuntura.

“Temos um grande desafio de assessorar o município na implementação das PICS e EPS, visto que, além do quantitativo de PICs há uma necessidade de organização da rede para esses atendimentos, bem como a formação profissional continuada e permanente. Atualmente a prioridade tem sido a Acupuntura e Auriculoterapia da Medicina Tradicional Chinesa e a Educação Popular em Saúde, que são as práticas que o maior número de trabalhadoras e trabalhadores desejam formação, segundo levantamento realizado”, explica a profa. Aline Nordi.

Os atendimentos podem ocorrer por livre demanda nas unidades de saúde com atendimento em PICs ou por encaminhamento de médicos, enfermeiros que identifiquem que o paciente possa se beneficiar dos recursos terapêuticos. Os principais encaminhamentos são para tratamento de dores, problemas do sono e saúde mental.

Os benefícios do yoga

Paula Furlan é professora do Depto. de Terapia Ocupacional da UFSCar e atua na área de Saúde Coletiva, Saúde Mental e processos terapêuticos em comunidades. Desde 2017, oferece na universidade, com o apoio da Pró-Reitoria de Assuntos Comunitários e Estudantis, do Departamento de Atenção à Saúde, e do projeto de extensão Práticas Integrativas de Cuidado e Suporte Social (PICS), grupos regulares e atendimentos terapêuticos individuais com yoga para demandas específicas de saúde mental, como pânico, depressão, ansiedade, ideação suicida. Coordena também, grupos de estudos e pesquisas científicas com yoga, orientando estudantes, estagiários e formando profissionais com o referencial de conhecimento do yoga.

“O Yoga é um sistema de conhecimento indiano, tradicional e milenar, estamos falando de uma sabedoria antiga e validada pela experiência humana, de muito mais de 2500 anos. Temos hoje muitas evidências da ciência moderna ocidental sobre os benefícios do yoga para a saúde mental, diminuindo a ansiedade e crises psíquicas, aliviando e tratando de dores físicas, como dor nas costas, enxaquecas, aumento da atenção e da concentração, melhorando a qualidade das relações sociais, do sono, do ritmo respiratório, da libido, como também temos evidências do incremento fisiológico da oxigenação corporal, de hormônios como serotonina, estrógeno, testosterona e diminuição do cortisol, por exemplo. Para isso, é importante a regularidade da prática por um certo tempo, responsabilizar-se pelo que está ao seu alcance resolver e manter a coragem para viver, enfrentar os desafios e possibilidades, dia após dia”, explica a professora.

De acordo com a terapeuta, técnicas para a estabilidade da mente, a concentração da atenção, o relaxamento do corpo físico, o reconhecimento das emoções e dos padrões de comportamento, para reequilibrar a respiração, para limpar as vias respiratórias e excretórias, por exemplo, são algumas oferecidas para, gradativamente, o praticante possa ir reconhecendo hábitos de ação e reação que não ajudam no seu desenvolvimento, que trazem doenças, infelicidade, desconforto, discórdias consigo e com outros e insatisfação em geral com a própria vida. “Atualmente, inauguramos o Grupo Yoga em Encontros para estudos, práticas e pesquisas em interface com a filosofia e os textos antigos. Este grupo é derivado de minha pesquisa de Pós-Doutorado que realizei entre 2022 e início deste ano, estudando o conhecimento tradicional do yoga. Temos também um curso livre online Vivências de Meditação, Relaxamento e Respiração, em parceria com a Secretaria de Educação à Distância. Já participaram mais de mil pessoas de todas essas iniciativas e já temos publicações científicas das pesquisas desenvolvidas. Se alguém quiser mais informações de como participar das diferentes ações, poderá entrar em contato com o email

Atendimento para a comunidade universitária e população em geral

Na UFSCar existem diversos projetos de extensão que atuam com ofertas de PICS para a população em geral e para a comunidade universitária. Nos últimos anos, o Departamento de Atenção à Saúde (DEAS) da UFSCar, em parceria com o Departamento de Terapia Ocupacional tem ofertado grupos terapêuticos e atendimentos individuais com Reiki e Yoga, com desenvolvimento de pesquisas científicas associadas e publicações realizadas.

Alguns docentes e TAs da UFSCar estão se articulando para organizar um serviço ambulatorial que oferte algumas práticas integrativas e complementares. Mas esse é um processo longo, depende de diversas pactuações institucionais e da constituição de uma equipe de excelência na área. Além disso, está sendo pensado não apenas o serviço de atendimento, mas em um espaço de formação de novos profissionais e pesquisa.

Esse tipo de iniciativa já acontece em outras universidades como na UNIFESP e na USP Ribeirão Preto, com inserção não só de pós-graduandos, mas também de alunos de graduação na área de saúde, despertando o interesse e capacitando os futuros profissionais a atuar clinicamente dispondo de uma caixa de ferramentas mais ampla e qualificada para lidar com a complexidade crescente dos problemas de saúde e aprendendo a constituir competências para lidar com a diversidade das culturas e dos modos de vida das pessoas.

Jornal ADUFSCar | Edição 5 – Março de 2023

 

 

 

 

 

 

 

Mais lidas

plugins premium WordPress

Teste

Enviar mensagem
Olá 👋
Podemos te ajudar?
Pular para o conteúdo